Por que as conversas nas empresas são repetitivas?
- Camila Scramim Rigo
- há 4 dias
- 2 min de leitura
Atualizado: há 3 dias
(texto publicado originalmente no Diário do Comércio de Minas em 28/03/2025)

Quem era criança nos anos 80 possivelmente trombou com um livro chamado “Nicolau tinha uma ideia”, de Ruth Rocha. Eu tinha certeza que ele era um livro sem palavras, mas pesquisando na Internet para escrever essa coluna descobri que não.
No meu livro sem palavras, existente no mundo real ou apenas na minha imaginação, Nicolau tinha uma ideia (no caso, um arco íris colocado dentro de um balãozinho de pensamento). Ele andava e encontrava pessoas, como Dona Maria, que tinha uma macarronada em seu próprio balãozinho de pensamento.
Ao se encontrarem, cada um deles expressava sua ideia (por meio de balõezinhos de fala) e a partir daí cada qual passava a ter as duas ideias na cabeça (arco íris e macarronada dentro de seus balõezinhos de pensamento).
O fenômeno se repetia pelo livro afora até Nicolau ter tantas ideias que não cabiam mais na página dupla.
O livro é muito feliz em ilustrar o quanto as interações com pessoas diferentes de nós deixam nosso mundo interno muito mais rico e colorido.
Mas não tem sido assim com as interações que, como consultora, tenho visto nas empresas. O livro “Nicolau na empresa” seria repetitivo, monocromático e chato.
Não necessariamente porque as pessoas não tenham, em suas bagagens e em seus mundos internos, ideias e pontos de vista diferentes para aportar. Mas porque escolhem trazer para seus balõezinhos de fala nas empresas apenas as ideias "adequadas à Cultura Organizacional". Basicamente para não desagradar e não colocar em risco seus empregos e suas carreiras. Sempre a mesma figurinha repetida, reunião atrás de reunião.
Por que isso acontece? Arrisco desagradar: porque a liderança não sabe conversar.
Vou fazer uma lista do tipo de comunicação que líderes costumam gostar (especialmente aqueles que ocupam o topo das hierarquias). São eles: indicadores, documentos one page, objetividade e assertividade, apresentações com no máximo 5 slides.
Indicadores e one pages contam uma parte da história. São bons para início de conversa, mas nunca trarão informações suficientes para a tomada de decisões sábias. Objetividade e assertividade são ótimas para filtrar irrelevâncias, mas para descrever problemas complexos produz visões reducionistas. Pedir apresentações com no máximo 5 slides pode ajudar na habilidade de fazer escolhas radicais, mas obrigará ao corte de tudo o que torna cada situação singular.
É verdade que não é possível descer constantemente ao nível de detalhes que os colaboradores envolvidos nos fatos desejam relatar. Mas o vício em informações mastigadas a todo momento empobrece a leitura dos contextos, descaracteriza e distancia públicos de interesse. E, ao longo do tempo, desengaja colaboradores da parceria com suas lideranças.
Tudo o que é vivo está em equilíbrio dinâmico. É só observar seus próprios pés, que ora vão para a direita, ora para a esquerda, ora para trás, ora para frente.
Organizações e times que queiram se manter vivos precisam valorizar momentos de divergir e momentos de convergir, momentos de aprofundar e momentos de sintetizar.
E precisam, em todos os momentos, valorizar a riqueza de estarem juntos, colaborando para que cada iniciativa, cada projeto e cada missão seja o melhor que podem ser.
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